Ana
Rocha: mynameisnotSEM…
Porquê?
mynameisnotSEM:
SEM é um alter-ego do tempo
do graffiti – tem cerca de 10 anos – que
uso por referência ao negativo e à subtracção. Portanto: não é uma sigla.
Exploro-o, também, pela questão oral. É
um algarismo? É uma negação? Esse trocadilho, fazia-o enquanto artista de graffiti: ora assinava com algarismos,
ora assinava com letras. E tem, também, que ver com o sentido literal da coisa
– o meu nome não é mesmo SEM, é Filipe – e com referências pessoais, como o
filme brasileiro O meu nome não é Johnny.
São várias as referências que acabam por se aglutinar no meu alter-ego.
A.R.:
O que é que fazes,
especificamente?
mynameisnotSEM:
Pintura, curadoria de
eventos, arte urbana e workshops (em escolas
de Ensino Primário, Básico e Secundário – exponho os alunos à técnica da
pintura).
A.R.:
Formação?
mynameisnotSEM:
Sou licenciado em Design de Comunicação pela ESAP – Escola
Superior Artística do Porto – e mestre em Design de Imagem pela FBAUP – Faculdade
de Belas Artes do Porto –, mas o meu percurso é não-normativo e só faço design pontualmente.
A.R.:
Criativo ou artista?
mynameisnotSEM:
Mais criativo do que
artista.
A.R.:
De que forma é que isso
se reflete no teu percurso académico?
mynameisnotSEM:
Durante o Mestrado
escolhi dissertação em vez de estágio. A minha dissertação é sobre o Desenlata.
A.R.:
O que é o Desenlata?
mynameisnotSEM:
O Desenlata é um festival
de arte independente. É autossuficiente – sustem-se no crowdfunding – e é organizado por mim, por mais (alguns) artistas e
por pessoas associadas à área. Surge a partir da minha vontade de desenvolver
projectos com artistas e com a comunidade sem produzir um conhecimento muito
extensivo e teórico – por associação às belas artes – pelo que tem, portanto,
um carácter prático. Há, aquando a frequência no Mestrado em Design de Imagem pela FBAUP, a oportunidade
de a dissertação se concretizar no próprio planeamento de um evento e, porque Matosinhos
é uma cidade especial para mim, pareceu-me interessante a ideia de explorar lá
o festival de arte urbana.
A.R.:
Que relação entre ti e Matosinhos?
mynameisnotSEM:
O mar, a indústria
conserveira e o facto de eu ter crescido, enquanto artista, nas fábricas
abandonadas de Matosinhos que, na sua maioria, eram fábricas de conserva. Matosinhos
era uma cidade industrial, mas está a tornar-se em habitação de luxo (…).
A.R.:
Como se concretiza, em
termos práticos, o Desenlata?
nynameisnotSEM: No primeiro ano, Desenlata – Festival de Arte Ilegal, um mural colectivo, um
workshop e uma exposição. Dois dias de evento, com um instameet. O ano passado, Desenlata
– Festival de Arte Independente, uma street
art tour: fizemos um circuito de colagens, concretizado, mais tarde, num
mapa. Em 2017, terceira edição, estamos a organizar uma exposição muito
especial em Matosinhos. Um mural colectivo – uma coisa mais ambiciosa do que na
primeira edição – e visitas guiadas às fábricas de conserva em funcionamento
(ainda existem duas). Sempre no primeiro fim-de-semana de Setembro, este ano a 2,
3 e 4 (Setembro de 2017).
A.R.:
Porquê fazer visitas
guiadas às fábricas de conservas?
mynameisnotSEM:
O Desenlata, para além
a arte urbana integrada no contexto da cidade de Matosinhos, quer celebrar a história
da cidade. É um festival com uma dimensão activista. Por que é que as fábricas deixam de existir e começam a aparecer casas?
Falamos sobre o que aconteceu porque é interessante descobrir isso e porque as
pessoas que, actualmente, aqui vivem não são de Matosinhos! Um dos capítulos da
minha dissertação tem que ver justamente com as fábricas abandonadas. Exploro o
que são espaços mortos e devolutos e concluo que aqueles espaços não estão
mortos: vivem lá pessoas – sem-abrigo, toxicodependentes – vivem lá animais, vivem
lá plantas… Há pessoal que vai lá roubar cobre e metais preciosos, há pessoal
que vai para lá depois da queima, para ter relações sexuais. Aqueles espaços,
no fundo, estão legalmente embargados. Têm actividade. O que está morto aos
olhos da lei, na prática, tem actividade.
A.R.:
Como defines o que
fazes profissionalmente?
mynameisnotSEM:
Sou um artista
plástico.
A.R.:
Que leitura podemos
fazer aos teus desenhos?
mynameisnotSEM:
Os meus desenhos têm
caracter abstrato. Eu não sei desenhar e não gosto do figurativo, então tento
fazer o que me é confortável – embora esteja sempre a experimentar técnicas
novas. A formação em design afecta a
minha percepção de arte e molda o que eu gosto de fazer. O trabalho que
desenvolvo é muito inspirado pelo design
e pela música eletrónica. Actualmente, pinto formas cheias de cor, mais ou
menos dinâmicas, por associação à música eletrónica. Gosto do minimal, do
psicadélico e (quase) não oiço voz – não gosto de músicas com voz.
A.R.:
Porquê?
mynameisnotSEM:
A expressão na ausência
de texto – através de imagem, som (…) – potencia um outro universo. Eu não me
identifico com a voz: a música fala sem voz! E, este trabalho, tem que ver com
a questão musical. A música é um prato, um bombo, um sampler, um sintetizador
(…). O que eu tenho tentado fazer é desconstruir e construir – tento encontrar
elementos visuais para compor o meu trabalho como se fosse música. É uma
abordagem (um bocadinho) diferente e muito pessoal.
A.R.:
Onde te encontramos
daqui a 10 anos?
mynameisnotSEM:
Não sei como me vejo
daqui a 10 anos. Estamos numa fase muito crítica para fazer planos: nós, a
sociedade, o país (…). Eu não gosto de fazer planos a longo prazo. Quero manter
esta actividade – é o sonho, sim! – e fazer
com que isto prolifere. Gosto de pintar em anarquia, mas o compromisso
profissional conforta.
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