Ana Rocha: Background em arte?
Constança: Estudei
Canto Lírico no Conservatório Nacional, pertenci a um dos Coros Juvenis do
Teatro Nacional de São Carlos, licenciei-me em Escultura na Faculdade de Belas
Artes de Lisboa e terminei, agora, o Mestrado em Artes Plásticas na ESAD.CR.
A.R.: A Constança
e a c'marie, são a mesma pessoa? Quem é a Constança? E quem é a c'marie?
C.: Sim e não. Essa
é difícil!, tenho que começar pelo início. Eu sempre fui uma criança muito
plural e, ainda que essa característica possa considerar-se uma qualidade, a
verdade é que me trouxe alguns momentos de dúvida e questões existenciais. Sempre
desenhei nas horas vagas, mas fiz todo o tipo de actividades e saltitei de um
lado para o outro. Desisti da ideia de ser neurocirurgiã para seguir o curso de
artes e, dessa forma, acentuou-se a questão da pluralidade. Por isso é que me
revejo tanto nos heterónimos de
Fernando Pessoa. O facto de ter diferentes formas de me expressar, de pertencer
por vezes a registos quase díspares, no mundo da Arte, no sentido mais
académico e institucional, nem sempre é fácil. Quando trabalhamos diferentes
dimensões, expressões e gestos, não somos (sempre) valorizados de igual forma.
Por isso é que, para mim, foi importante – e até necessário! – fazer a
distinção, ao invés de optar. Enquanto a Constança ocupa o espaço dedicado à
Escultura, à ideia da introspecção, o íntimo e a memória vivencial, a c'marie
pertence à Ilustração, ao lado mais frenético, do quotidiano, imediato,
temático. A Constança é mais ‘profunda’, mais complicada. É extremamente
exigente e, às vezes, os amigos acusam-na de ver o copo meio vazio, mesmo
quando ele está cheio, a transbordar. A c’marie é o lado mais livre, positivo.
Mais leve, mais simples, mais acessível e comunicativa, vive num desafiar-se
constante. As minhas personas nunca se encontram nem perturbam, e têm em
comum o facto de serem muito trabalhadoras, de viverem muito do coração. Gosto
que a c'marie seja (quase) independente, uma espécie de máscara que uso só em
determinadas situações. É o meu lado despreocupado: não precisa que o trabalho
esteja exposto num museu ou galeria; não espera que o espectador surja e
contemple. É ela quem se atravessa no quotidiano das pessoas. Com a ilustração
posso comunicar num artigo ou livro, mas através da street art comunico em paredes, na rua, no dia-a-dia… Com a c'marie
volto aos tempos de infância, em que desenhava nas toalhas de papel dos
restaurantes, e que a minha mãe ainda hoje guarda nos álbuns de família. Centro-me
em gestos, expressões, pessoas, temas. Tento captar a sua essência, aquele
segundo... Tento que passe sempre uma mensagem e que, ainda assim, haja espaço
para uma interpretação ou pensamento próprio. Hoje, como freelancer, foco-me
mais na c'marie. Aceito encomendas, exponho o meu trabalho e ingresso em alguns
projectos.
A.R.: De que modo te moldou, o Porto, enquanto artista?
C.: No Porto encontrei
vários artistas com a preocupação de desenvolver trabalho sério, de diálogo
entre o artista e o público. Senti que estava em casa. Há cidades que (ainda)
não estão disponíveis para receber o “novo” modelo artístico, a arte que pode pertencer
ao núcleo da vida, nas ruas. No Porto, os artistas conseguem que as pessoas
olhem, de facto, e se questionem e envolvam; conseguem que os procurem,
partilhem e sigam. A sensibilidade do público para com a arte na rua, no Porto,
é uma característica que eu adorei.
A.R.: Qual é, actualmente, o teu maior desafio?
C.: O meu maior
desafio (leia-se: objectivo), actualmente, é ser bem-sucedida. Acabei recentemente
o Mestrado em Artes Plásticas e chegou o fatídico momento de ingressar na vida
adulta, no mercado de trabalho. Tenho de arranjar um “emprego sério”, que pague
as contas e, confesso, não me imagino em horário fixo, atrás de uma secretária,
a responder a briefings e/ou linguagens artísticas que não a minha. A
maioria dos artistas tenta não falar desta questão, mas é importante. A arte é
a minha profissão. Pretendo sentir-me realizada e feliz, mas também remunerada.
A.R.: O que podemos esperar de ti no futuro?
C.: Tenho
estado a planear projectos interventivos, de cariz social e político, que
abordem questões de pensamento individual e colectivo.
A.R.: A intervenção em rua – street art – e a arte, em geral,
podem ser agentes de mudança social? Como te posicionas, a ti e ao teu
trabalho, relativamente a esta questão?
C.: A arte tem,
em parte, esse dever, de se dirigir às pessoas e de fazê-las questionarem-se,
de colocar o 'dedo na ferida'. Quero que o meu trabalho se mute e avance, que
passe a ter uma carga mais retórica e de chamada de atenção.
A.R.: Por onde podemos acompanhar os teus projectos?
Sem comentários:
Enviar um comentário