Ana Rocha: Quem é o DiogoFaro?
Diogo Faro: Sou de Lisboa e cresci em Alvalade. Estudei
Publicidade e Marketing, fiz Erasmus na República Checa e trabalhei em
duas Agências de Publicidade – era criativo; trabalhava como copywriter
e fazia activação de marca. Em 2011, quando estava a trabalhar na Bulgária,
fundei o blogue – Sensivelmente Idiota – que passou, quase no
imediato, a página do Facebook. A conta cresceu e surgiram
oportunidades para trabalhar como speaker, em eventos e activações de
marca. Mais tarde, comecei a fazer stand-up, gostei da sensação e, um
dia, decidi despedir-me para me tornar comediante profissional. Foi há cinco
anos.
A.R.: Ser comediante é uma profissão.
D.F.: Sim, é disso que eu vivo. Há cinco anos aventurei-me
numa transição profissional e, depois de um ano, conquistei a independência
financeira. Consegui subsistir e saí de casa da minha mãe. Agora tenho dinheiro
para viver com a comédia e é excelente.
A.R.: A comédia pode ser um agente de mudança social?
D.F.: Pode. O meu primeiro objectivo é sempre fazer rir,
mas eu não consigo dissociar as minhas opiniões do meu trabalho. Há muitos
comediantes acerca dos quais não sabes nada, ainda que te rias muito com eles:
não sabes a opinião deles sobre a equidade de género, sobre o fascismo ou, até,
o clube de futebol. Eu não consigo dissociar, tenho opiniões muito fortes. Não
quero dizer que não as mude, mas tento sempre informar-me, ler e ver
documentários e, por acumular conhecimento, quando estou a fazer humor, não
consigo dissociar, não gosto de fazer humor sobre escorregar numa casca de
banana.
André Couceiro:
De que forma é que a tua educação e a tua infância impactaram a tua
forma de pensar e de expores publicamente a tua posição?
D.F.: A minha família é muito culta e, desde pequeno,
incentivavam-me a ler e levavam-me a viajar; desde muito cedo. O meu pai é
altamente liberal – é um dos músicos da revolução de Abril – e a minha mãe é
cantora de ópera, mas o meu pai, neste sentido revolucionário… [Ele] andava com
o Zeca Afonso e com o Sérgio Godinho a contestar o regime e as faltas de
liberdade. Eu acho que também faço um bocadinho isso: não tenho nenhum
propósito gigante – não acho que vou mudar mentalidades – mas se, através da
comédia, conseguir fazer as pessoas pensarem um bocadinho numa direcção que eu
acho que é melhor para a sociedade, fixe. Não acho mesmo que vá conseguir mudar
grande merda e que esteja aqui como um messias – nada disso!, não tenho o
complexo de messias, não acho que tenha o dom da palavra –, mas tenho estas
opiniões sobre a normalidade da homossexualidade, a normalidade da
bissexualidade, da poligamia, enfim, para mim está tudo bem desde que as
pessoas sejam felizes, e se eu puder usar a comédia um bocadinho para ajudar as
pessoas a pensar nestas coisas, melhor.
A.C.: Já tinhas tido algum contacto com esta
questão do activismo antes de usares a comédia, quando eras mais novo?
D.F.: Não, só enquanto comediante, não sou activista – não
participo em greves e em manifestações – e prefiro fazer uma crónica boa sobre
o assunto, com a qual as pessoas se riam e pensem. Já participei em
Conferências do #HeforShe, mas o meu trabalho é ser comediante.
A.R.: Em 2018, podemos começar a pensar no #SheforHe?
D.F.: Para mim é uma questão de defesa dos direitos das
pessoas. Não é para agora – não podemos deixar já de falar sobre os direitos
das mulheres e de chamar a esse movimento feminismo – mas, para mim, se este
fosse um mundo fixe, falávamos sobre os direitos das pessoas. Homens, mulheres,
homossexuais e bissexuais: se quiserem lamber um homem de manhã e comer uma
gaja à noite, está tudo bem. As pessoas têm que viver a sua cena felizes.
A.R.: As pessoas com quem fazes humor – por exemplo, o
Pedro Chagas Freitas – ficam felizes?
D.F.: Coitado. O Pedro Chagas Freitas fala sobre aquelas
chachadas de merda, vende, faz muito dinheiro… Deve estar contente, a vender
livros de contos da Disney para adultos, provavelmente para mulheres que
estão tristes – com tanta merda que há para ler! Acho que esse não tem nada
contra mim. O Gustavo não deve gostar.
A.R.: O Gustavo Santos?
D.F.: Dei-lhe baile durante muito tempo, entretanto
cansei-me. Não desejo mal a essas pessoas, só acho que o trabalho delas é
péssimo. Até ouvi uma entrevista do Pedro Chagas Freitas e achei-o um gajo
fixe, escreve é uma merda.
A.R.: Três livros favoritos?
D.F.: A Aparição, de Virgílio Ferreira; Sapiens, de Yuval
Noah Harari; Os Cus de Judas, de António Lobo Antunes.
A.R.: No Maluco Beleza, Rui Unas e Frederico Pombares
discutem a ideia de que os humoristas desenvolvem o humor porque carecem de boa
aparência. Como te posicionas?
D.F.: Há tantos comediantes: uns são bonitos, outros são
feios, uns são inteligentes e outros são burros (…).
A.R.: Quem são os bonitos?
D.F.: Eu!, de resto é um bocado irrelevante. Há muitos que
me fazem rir e outros que são péssimos.
A.R.: Quais são os melhores?
D.F.: Eu sou fã de várias gerações. O Herman. Acho que foi super
importante. Foi importante para que pudesse aparecer um Ricardo Araújo Pereira,
para que aparecesse um Bruno Nogueira, de quem eu gosto muito (…), e para que,
depois, continuassem a aparecer outros, como o Salvador Martinha, e os
humoristas da minha geração, que são menos conhecidos mas excelentes, e a quem
desejo maior reconhecimento: Guilherme Fonseca, Pedro Durão, Pedro Sousa e mais
uma data de gente que trabalha comigo. Em Portugal, essas são as minhas
referências. Herman, Ricardo e Bruno.
A.R.: Em todas as referências não há uma mulher. Há
humoristas em Portugal?
D.F.: Há! A Maria Rueff – ainda que não a coloque nos
melhores três –, a Bumba na Fofinha, a Rita Camarneiro… Há mulheres no humor
mas, efectivamente, não são tão boas.
A.R.: Porquê?
D.F.: Culturalmente, é difícil. Vivemos num país machista.
A.C.: Achas que isso pode ter influência
quando uma mulher pensa em desenvolver carreira como humorista?
D.G.: Sim. Mais, está muito enraizada a ideia de que se uma
mulher vai fazer piadas, essas piadas são sobre pilas.
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